M., 24, tem
pesadelos recorrentes com exame de toque vaginal. Há dois meses, toma
antidepressivos e frequenta psicólogo. E se esforça para esquecer da primeira
consulta ginecológica.
M. e a mãe
L., 49, foram as primeiras de um grupo de 11 mulheres que relataram à polícia
terem sido vítimas do médico Rogério Pedreiro, 48, preso em 31 de agosto. O
caso corre sob sigilo. A Folha falou com cinco delas.
Justiça já
negou dois pedidos para soltar médico
Em
depoimento, o médico, que atuava como ginecologista e ultrassonografista, negou
as acusações. Disse que foram exames e consultas normais. Ele segue preso.
A
arrumadeira Almira da Rocha Oliveira, 43, reconheceu Pedreiro ao vê-lo em uma
reportagem na TV e foi à delegacia denunciá-lo. "Enfim, confirmei minhas
cismas."
Ela --a
única que autorizou a divulgação do nome e imagem-- diz que frequentava a
clínica do médico, em Moema (zona sul), desde 2009.
Almira fez,
com ele, cinco exames de ultrassom transvaginal para monitorar miomas. "Em
todas as vezes, ele perguntou se eu sentia prazer quando colocava o aparelho.
Era esquisito, mas eu pensava: 'Alzira, abre a cabeça. É pergunta de
médico'."
Ela diz ter
estranhado o fato de o médico não usar luvas e nem fornecer avental às pacientes
durante o exame.
O relato da
vendedora V., 35, é semelhante. Ela diz que, em 2004, procurou o médico porque
queria engravidar.
"Durante
o exame de toque vaginal, ele perguntou se eu sentia prazer quando ele me
tocava. Respondi que não."
V. conta
que, no início, pensou ser uma pergunta "normal". Mas, ao voltar 15
dias depois para fazer um ultrassom, a situação se repetiu.
"Ele
colocou o aparelho na vagina, ficou mexendo com a mão e perguntando se eu
sentia prazer. Respondi brava: 'Não estou sentindo nada'. Ele parou na
hora."
Depois
disso, só vai à "ginecologista mulher".
Em 2006, a
atendente J., 29, procurou o médico para fazer um ultrassom transvaginal.
"No exame, ele perguntou se eu sentia prazer fácil. Fiquei sem graça e
disse que, se fosse com o meu marido, eu sentia. Ele colocou o aparelho e
perguntou: 'E assim?' Eu disse: 'Tá machucando'. Aí ele parou. Não voltei mais."
EXAME
DEMORADO
M. e a mãe
se consultaram com Pedreiro no mesmo dia, 18 de junho. A primeira a entrar na
sala foi a mãe. "No exame de toque vaginal, ele ficou, ficou [com o dedo
na vagina]. Nunca fiz um exame tão demorado", diz L.
Já M. relata
que, ao entrar na sala do médico, levou uma bronca pela demora em procurar um
ginecologista.
"Primeiro,
ele colocou o dedo na vagina e ia apalpando aqui embaixo [região pélvica].
Depois, pegou no meu braço e disse: 'Você tem bastante hormônio. Não sente vontade
de se masturbar?'". M. saiu da sala e não falou nada para a mãe.
"Fiquei com vergonha."
Dias depois,
comentou com uma amiga. "Ela disse que ginecologista não fala essas
coisas." Foi aí que M. contou para os pais. "Ela sentia desespero,
culpa, raiva. Ficou agressiva", lembra a mãe.
O pai relata
que quase "perdeu a cabeça". "Pensei em invadir o consultório e
quebrar a cara dele." A mãe diz que a família não quer indenização.
"Só que ele pague pelo o que fez", afirma.
CLÁUDIA COLLUCCI
DE SÃO PAULO
A fé em perigo
Dia 11 de outubro próximo, tem início o Ano da Fé,
estabelecido pelo Papa Bento XVI. A data coincide com a comemoração dos 50 anos
da abertura do Concílio Vaticano II e dos 20 anos da publicação do Catecismo da
Igreja Católica.
Quando estava em Roma,
no ano 2001, assisti admirado, na Praça de São Pedro, à chegada de milhares de
fiéis do movimento Kolping, vindos da Alemanha, sobretudo homens, cantando com
entusiasmo contagiante. Comentei então com um Cardeal alemão que estava ao meu
lado: "Diante disso, Eminência, não se pode dizer que a Alemanha não seja
um país católico!" Ele, porém, observou, acalmando um pouco o meu
entusiasmo: "É, mas a Fé sempre corre perigo!". Era o Cardeal Joseph
Ratzinger, prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé.
O Papa tem se mostrado preocupado com a crise da Fé:
"Desde o princípio do meu ministério como Sucessor de Pedro, lembrei a
necessidade de redescobrir o caminho da fé para fazer brilhar, com evidência
sempre maior, a alegria e o renovado entusiasmo do encontro com Cristo...
Sucede não poucas vezes que os cristãos sintam maior preocupação com as
consequências sociais, culturais e políticas da fé do que com a própria fé,
considerando esta como um pressuposto óbvio da sua vida diária. Ora, tal
pressuposto não só deixou de existir, mas frequentemente acaba até negado.
Enquanto, no passado, era possível reconhecer um tecido cultural unitário,
amplamente compartilhado no seu apelo aos conteúdos da fé e aos valores por ela
inspirados, hoje parece que já não é assim em grandes sectores da sociedade
devido a uma profunda crise de fé que atingiu muitas pessoas. Não devemos
aceitar que o sal se torne insípido e a luz fique escondida... Devemos
readquirir o gosto de nos alimentarmos da Palavra de Deus, transmitida
fielmente pela Igreja, e do Pão da vida, oferecidos como sustento de quantos
são seus discípulos..." (Carta Apostólica Porta Fidei, pela qual Bento XVI
proclama o Ano da Fé).
Nesse momento, reúne-se com o Santo Padre em Roma a XIII
Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, tendo por tema "A nova
evangelização para a transmissão da fé cristã".
O que moveu o Papa a essa nova evangelização ele já havia
lembrado no discurso inaugural da Conferência do CELAM, em Aparecida:
"Percebe-se certo enfraquecimento da vida cristã no conjunto da sociedade
e da própria pertença à Igreja Católica". Na mesma linha, os Bispos do
CELAM escreveram: "O Santo Padre nos responsabilizou ainda mais, como Igreja,
na grande tarefa de proteger e alimentar a fé do povo de Deus... Nas últimas
décadas vemos com preocupação, que numerosas pessoas perdem o sentido
transcendental de suas vidas e abandonam as práticas religiosas... Não
resistiria aos embates do tempo atual uma fé católica reduzida a uma bagagem, a
um elenco de algumas normas e de proibições, a práticas de devoção
fragmentadas, a adesões seletivas e parciais das verdades da fé, a uma
participação ocasional em alguns sacramentos, à repetição de princípios
doutrinais, a moralismos brandos ou crispados que não convertem a vida dos
batizados. Nossa maior ameaça é o medíocre pragmatismo da vida cotidiana da
Igreja, no qual, aparentemente, tudo procede com normalidade, mas na verdade a
fé vai se desgastando e degenerando em mesquinhez" (Documento de
Aparecida, n. 7, 12, 100 f).
Dom Fernando
Arêas Rifan
Bispo da
Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney
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