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quinta-feira, 22 de setembro de 2011

PAPA NA ALEMANHA.

Políticas devem visar justiça para criar a paz, salienta o Papa

Nicole Melhado
Da Redação


Reuters

Bento XVI foi o primeiro Papa a falar ao Parlamento alemão
Em seu discurso histórico ao Parlamento alemão, pronunciado nesta quinta-feira, 22, o Papa Bento XVI enfatizou que a política deve ser um compromisso em prol da justiça e, assim, criar as condições para a paz.

Com base na pequena narrativa tirada do Primeiro Livro dos Reis, onde o rei Salomão pede a Deus “um coração dócil, para saber administrar a justiça ao teu povo e discernir o bem do mal”, Bento XVI salienta que a Bíblia quer indicar o que deve, em última análise, ser importante para um político.

“O seu critério último e a motivação para o seu trabalho como político não devem ser o sucesso e menos ainda o lucro material”, reforçou o Pontífice.

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.: NA ÍNTEGRA - Discurso de Bento XVI ao Parlamento alemão

A busca pelo sucesso é natural para um político, reconhece o Santo Padre, mas ele salienta que o sucesso há-de estar subordinado ao critério da justiça, à vontade de atuar o direito e à inteligência do direito. “O sucesso pode tornar-se também um aliciamento, abrindo assim a estrada à falsificação do direito, à destruição da justiça”, disse o Papa.


Estado sem justiça
“Nós, alemães, sabemos pela nossa experiência que estas palavras não são um fútil espantalho. Experimentamos a separação entre o poder e o direito, o poder colocar-se contra o direito, o seu espezinhar o direito, de tal modo que o Estado se tornara o instrumento para a destruição do direito: tornara-se uma banda de salteadores muito bem organizada, que podia ameaçar o mundo inteiro e impeli-lo até à beira do precipício”, salientou o Papa.

Para o Santo Padre, servir o direito e combater o domínio da injustiça é a tarefa fundamental do político.

“Num momento histórico em que o homem adquiriu um poder até agora impensável, esta tarefa torna-se particularmente urgente. O homem é capaz de destruir o mundo. Pode manipular-se a si mesmo. Pode, por assim dizer, criar seres humanos e excluir outros seres humanos de serem homens. Como reconhecemos o que é justo? Como podemos distinguir entre o bem e o mal, entre o verdadeiro direito e o direito apenas aparente? O pedido de Salomão permanece a questão decisiva perante a qual se encontram também hoje o homem político e a política”, afirmou.

Bento XVI salientou que nas questões fundamentais do direito, em que está em jogo a dignidade do homem e da humanidade, o princípio maioritário não basta: no processo de formação do direito, cada pessoa que tem responsabilidade deve ela mesma procurar os critérios da própria orientação.

Reuters

Em seu discurso ao Parlamento alemão, o Papa recordou a resistência de alguns alemães diante do nazismo'
Resistência dos alemães diante do nazismo

No século III, recordou o Pontífice, o grande teólogo Orígenes justificou assim a resistência dos cristãos a certos ordenamentos jurídicos em vigor dizendo que “se alguém se encontrasse no povo de Scizia que tem leis irreligiosas e fosse obrigado a viver no meio deles, (…) estes agiriam, sem dúvida, de modo muito razoável se, em nome da lei da verdade que precisamente no povo da Scizia é ilegalidade, formassem juntamente com outros, que tenham a mesma opinião, associações mesmo contra o ordenamento em vigor”.

“Com base nesta convicção, os combatentes da resistência agiram contra o regime nazista e contra outros regimes totalitários, prestando assim um serviço ao direito e à humanidade inteira. Para estas pessoas era evidente de modo incontestável que, na realidade, o direito vigente era injustiça. Mas, nas decisões de um político democrático, a pergunta sobre o que corresponda agora à lei da verdade, o que seja verdadeiramente justo e possa tornar-se lei não é igualmente evidente”, disse o Papa.

Para o Pontífice, saber como reconhecer aquilo que verdadeiramente justo, atualmente, não é uma tarefa fácil, mas com base numa referência à Divindade é possível distinguir aquilo que é justo entre os homens.

“Ao contrário doutras grandes religiões, o cristianismo nunca impôs ao Estado e à sociedade um direito revelado, um ordenamento jurídico derivado duma revelação. Mas apelou para a natureza e a razão como verdadeiras fontes do direito; apelou para a harmonia entre razão objetiva e subjetiva, mas uma harmonia que pressupõe serem as duas esferas fundadas na Razão criadora de Deus”, destacou.


Ciência e religião

Em seu discurso, o Papa salientou que hoje é aceita uma concepção positivista de natureza, que compreende a natureza de modo puramente funcional sem criar qualquer ponte para a ética e o direito.

“A ética e a religião devem ser atribuídas ao âmbito subjetivo, caindo fora do âmbito da razão no sentido estrito do termo. Onde vigora o domínio exclusivo da razão positivista – e tal é, em grande parte, o caso da nossa consciência pública –, as fontes clássicas de conhecimento da ética e do direito são postas fora de jogo. Esta é uma situação dramática que interessa a todos e sobre a qual é necessário um debate público; convidar urgentemente para ele é uma intenção essencial deste discurso”, disse o Santo Padre ao Parlamento.

Segundo Bento XVI, o conceito positivista de natureza e de razão, a visão positivista do mundo é, no seu conjunto, uma parcela grandiosa do conhecimento humano e da capacidade humana, à qual não deve-se de modo algum renunciar. Mas ela mesma no seu conjunto não é uma cultura que corresponda e seja suficiente ao ser humano em toda a sua amplitude.

“Onde a razão positivista se considera como a única cultura suficiente, relegando todas as outras realidades culturais para o estado de subculturas, aquela diminui o homem, antes, ameaça a sua humanidade. Digo isto pensando precisamente na Europa, onde vastos ambientes procuram reconhecer apenas o positivismo como cultura comum e como fundamento comum para a formação do direito, enquanto todas as outras convicções e os outros valores da nossa cultura são reduzidos ao estado de uma subcultura”, afirmou.
O Papa destacou que a Europa se coloca, face às outras culturas do mundo, numa condição de falta de cultura e suscitam-se, ao mesmo tempo, correntes extremistas e radicais.

“A razão positivista, que se apresenta de modo exclusivista e não é capaz de perceber algo para além do que é funcional, assemelha-se aos edifícios de cimento armado sem janelas, nos quais nos damos o clima e a luz por nós mesmos e já não queremos receber estes dois elementos do amplo mundo de Deus. E no entanto não podemos iludir-nos, pois em tal mundo auto-construído bebemos em segredo e igualmente nos "recursos" de Deus, que transformamos em produtos nossos. É preciso tornar a abrir as janelas, devemos olhar de novo a vastidão do mundo, o céu e a terra e aprender a usar tudo isto de modo justo”, concluiu o Papa.


Fonte: caçãonova.com.br


Discurso de Bento XVI ao Parlamento alemão
Boletim da Santa Sé

Ilustre Senhor Presidente Federal!
Senhor Presidente do Bundestag!
Senhora Chanceler Federal!
Senhor Presidente do Bundesrat!
Senhoras e Senhores Deputados!

Constitui para mim uma honra e uma alegria falar diante desta Câmara Alta, diante do Parlamento da minha Pátria alemã, que se reúne aqui em representação do povo, eleita democraticamente para trabalhar pelo bem da República Federal da Alemanha. Quero agradecer ao Senhor Presidente do Bundestag o convite que me fez para pronunciar este discurso, e também as amáveis palavras de boas-vindas e de apreço com que me acolheu.

Neste momento, dirijo-me a vós, prezados Senhores e Senhoras, certamente também como concidadão que se sente ligado por toda a vida às suas origens e acompanha solidariamente as vicissitudes da Pátria alemã. Mas o convite para pronunciar este discurso foi-me dirigido a mim como Papa, como Bispo de Roma, que carrega a responsabilidade suprema da Igreja Católica. Deste modo, vós reconheceis o papel que compete à Santa Sé como parceira no seio da Comunidade dos Povos e dos Estados. Na base desta minha responsabilidade internacional, quero propor-vos algumas considerações sobre os fundamentos do Estado liberal de direito.

Seja-me permitido começar as minhas reflexões sobre os fundamentos do direito com uma pequena narrativa tirada da Sagrada Escritura. Conta-se, no Primeiro Livro dos Reis, que Deus concedeu ao jovem rei Salomão fazer um pedido por ocasião da sua entronização. Que irá pedir o jovem soberano neste momento tão importante: sucesso, riqueza, uma vida longa, a eliminação dos inimigos? Não pede nada disso; mas sim: “Concede ao teu servo um coração dócil, para saber administrar a justiça ao teu povo e discernir o bem do mal” (1 Re 3, 9).

Com esta narração, a Bíblia quer indicar-nos o que deve, em última análise, ser importante para um político. O seu critério último e a motivação para o seu trabalho como político não devem ser o sucesso e menos ainda o lucro material.

A política deve ser um compromisso em prol da justiça e, assim, criar as condições de fundo para a paz. Naturalmente um político procurará o sucesso, que, de per si, lhe abre a possibilidade de uma ação política efetiva; mas o sucesso há-de estar subordinado ao critério da justiça, à vontade de atuar o direito e à inteligência do direito. É que o sucesso pode tornar-se também um aliciamento, abrindo assim a estrada à falsificação do direito, à destruição da justiça. “Se se põe de parte o direito, em que se distingue então o Estado de uma grande banda de salteadores?” – sentenciou uma vez Santo Agostinho (De civitate Dei IV, 4, 1).

Nós, alemães, sabemos pela nossa experiência que estas palavras não são um fútil espantalho. Experimentamos a separação entre o poder e o direito, o poder colocar-se contra o direito, o seu espezinhar o direito, de tal modo que o Estado se tornara o instrumento para a destruição do direito: tornara-se uma banda de salteadores muito bem organizada, que podia ameaçar o mundo inteiro e impeli-lo até à beira do precipício. Servir o direito e combater o domínio da injustiça é e permanece a tarefa fundamental do político.

Num momento histórico em que o homem adquiriu um poder até agora impensável, esta tarefa torna-se particularmente urgente. O homem é capaz de destruir o mundo. Pode manipular-se a si mesmo. Pode, por assim dizer, criar seres humanos e excluir outros seres humanos de serem homens. Como reconhecemos o que é justo? Como podemos distinguir entre o bem e o mal, entre o verdadeiro direito e o direito apenas aparente? O pedido de Salomão permanece a questão decisiva perante a qual se encontram também hoje o homem político e a política.
Grande parte da matéria que se deve regular juridicamente, pode ter por critério suficiente o da maioria. Mas é evidente que, nas questões fundamentais do direito em que está em jogo a dignidade do homem e da humanidade, o princípio maioritário não basta: no processo de formação do direito, cada pessoa que tem responsabilidade deve ela mesma procurar os critérios da própria orientação.

No século III, o grande teólogo Orígenes justificou assim a resistência dos cristãos a certos ordenamentos jurídicos em vigor: “Se alguém se encontrasse no povo de Scizia que tem leis irreligiosas e fosse obrigado a viver no meio deles, (…) estes agiriam, sem dúvida, de modo muito razoável se, em nome da lei da verdade que precisamente no povo da Scizia é ilegalidade, formassem juntamente com outros, que tenham a mesma opinião, associações mesmo contra o ordenamento em vigor” [Contra Celsum GCS Orig. 428 (Koetschau); cf. A. Fürst, "Monotheismus und Monarchie. Zum Zusammenhang von Heil und Herrschaft in der Antike", in Theol.Phil. 81 (2006) 321-338; a citação está na página 336; cf. também J. Ratzinger, Die Einheit der Nationem, Eine Vision der Kirchenväter (Salzburg-München 1971) 60].

Com base nesta convicção, os combatentes da resistência agiram contra o regime nazista e contra outros regimes totalitários, prestando assim um serviço ao direito e à humanidade inteira. Para estas pessoas era evidente de modo incontestável que, na realidade, o direito vigente era injustiça. Mas, nas decisões de um político democrático, a pergunta sobre o que corresponda agora à lei da verdade, o que seja verdadeiramente justo e possa tornar-se lei não é igualmente evidente.

Hoje, de fato, não é de per si evidente aquilo que seja justo e possa tornar-se direito vigente relativamente às questões antropológicas fundamentais. À questão de saber como se possa reconhecer aquilo que verdadeiramente é justo e, deste modo, servir a justiça na legislação, nunca foi fácil encontrar resposta e hoje, na abundância dos nossos conhecimentos e das nossas capacidades, uma tal questão tornou-se ainda muito mais difícil.

Como se reconhece o que é justo? Na história, os ordenamentos jurídicos foram quase sempre religiosamente motivados: com base numa referência à Divindade, decide-se aquilo que é justo entre os homens.

Ao contrário doutras grandes religiões, o cristianismo nunca impôs ao Estado e à sociedade um direito revelado, um ordenamento jurídico derivado duma revelação. Mas apelou para a natureza e a razão como verdadeiras fontes do direito; apelou para a harmonia entre razão objectiva e subjectiva, mas uma harmonia que pressupõe serem as duas esferas fundadas na Razão criadora de Deus. Deste modo, os teólogos cristãos associaram-se a um movimento filosófico e jurídico que estava formado já desde o século II (a.C.).

De fato, na primeira metade do século II pré-cristão, deu-se um encontro entre o direito natural social, desenvolvido pelos filósofos estoicos, e autorizados mestres do direito romano [cf. W. Waldstein, Ins Herz geschrieben. Das Naturrecht als Fundament einer menschlichen Gesellschaft (Augsburg 2010) 11ss; 31-61]. Neste contacto nasceu a cultura jurídica ocidental, que foi, e é ainda agora, de importância decisiva para a cultura jurídica da humanidade.

Desta ligação pré-cristã entre direito e filosofia parte o caminho que leva, através da Idade Média cristã, ao desenvolvimento jurídico do Iluminismo até à Declaração dos Direitos Humanos e depois à nossa Lei Fundamental alemã, pela qual o nosso povo reconheceu, em 1949, “os direitos invioláveis e inalienáveis do homem como fundamento de toda a comunidade humana, da paz e da justiça no mundo”.

Foi decisivo para o desenvolvimento do direito e o progresso da humanidade que os teólogos cristãos tivessem tomado posição contra o direito religioso, requerido pela fé nas divindades, e se tivessem colocado da parte da filosofia, reconhecendo como fonte jurídica válida para todos a razão e a natureza na sua correlação. Esta opção realizara-a já São Paulo, quando afirma na Carta aos Romanos: “Quando os gentios que não têm a Lei [a Torah de Israel], por natureza agem segundo a Lei, eles (…) são lei para si próprios. Esses mostram que o que a Lei manda praticar está escrito nos seus corações, como resulta do testemunho da sua consciência” (Rm 2, 14-15).

Aqui aparecem os dois conceitos fundamentais de natureza e de consciência, sendo aqui a “consciência” o mesmo que o "coração dócil" de Salomão, a razão aberta à linguagem do ser. Deste modo se até à época do Iluminismo, da Declaração dos Direitos Humanos depois da II Guerra Mundial e até à formação da nossa Lei Fundamental, a questão acerca dos fundamentos da legislação parecia esclarecida, no último meio século verificou-se uma dramática mudança da situação.

Hoje considera-se a ideia do direito natural uma doutrina católica bastante singular, sobre a qual não valeria a pena discutir fora do âmbito católico, de tal modo que quase se tem vergonha mesmo só de mencionar o termo. Queria brevemente indicar como se veio a criar esta situação. Antes de mais nada é fundamental a tese segundo a qual haveria entre o ser e o dever ser um abismo intransponível: do ser não poderia derivar um dever, porque se trataria de dois âmbitos absolutamente diversos.

A base de tal opinião é a concepção positivista, quase geralmente adoptada hoje, de natureza e de razão. Se se considera a natureza – no dizer de Hans Kelsen - “um agregado de dados objetivos, unidos uns aos outros como causas e efeitos”, então realmente dela não pode derivar qualquer indicação que seja de algum modo de carácter ético (Waldstein, op. cit., 15-21).

Uma concepção positivista de natureza, que compreende a natureza de modo puramente funcional, tal como a explicam as ciências naturais, não pode criar qualquer ponte para a ética e o direito, mas suscitar de novo respostas apenas funcionais.

Entretanto o mesmo vale para a razão numa visão positivista, que é considerada por muitos como a única visão científica. Segundo ela, o que não é verificável ou falsificável não entra no âmbito da razão em sentido estrito.

Por isso, a ética e a religião devem ser atribuídas ao âmbito subjectivo, caindo fora do âmbito da razão no sentido estrito do termo. Onde vigora o domínio exclusivo da razão positivista – e tal é, em grande parte, o caso da nossa consciência pública –, as fontes clássicas de conhecimento da ética e do direito são postas fora de jogo. Esta é uma situação dramática que interessa a todos e sobre a qual é necessário um debate público; convidar urgentemente para ele é uma intenção essencial deste discurso.

O conceito positivista de natureza e de razão, a visão positivista do mundo é, no seu conjunto, uma parcela grandiosa do conhecimento humano e da capacidade humana, à qual não devemos de modo algum renunciar. Mas ela mesma no seu conjunto não é uma cultura que corresponda e seja suficiente ao ser humano em toda a sua amplitude.

Onde a razão positivista se considera como a única cultura suficiente, relegando todas as outras realidades culturais para o estado de subculturas, aquela diminui o homem, antes, ameaça a sua humanidade. Digo isto pensando precisamente na Europa, onde vastos ambientes procuram reconhecer apenas o positivismo como cultura comum e como fundamento comum para a formação do direito, enquanto todas as outras convicções e os outros valores da nossa cultura são reduzidos ao estado de uma subcultura.

Assim coloca-se a Europa, face às outras culturas do mundo, numa condição de falta de cultura e suscitam-se, ao mesmo tempo, correntes extremistas e radicais. A razão positivista, que se apresenta de modo exclusivista e não é capaz de perceber algo para além do que é funcional, assemelha-se aos edifícios de cimento armado sem janelas, nos quais nos damos o clima e a luz por nós mesmos e já não queremos receber estes dois elementos do amplo mundo de Deus. E no entanto não podemos iludir-nos, pois em tal mundo auto-construído bebemos em segredo e igualmente nos "recursos" de Deus, que transformamos em produtos nossos. É preciso tornar a abrir as janelas, devemos olhar de novo a vastidão do mundo, o céu e a terra e aprender a usar tudo isto de modo justo.

Mas, como fazê-lo? Como encontramos a entrada justa na vastidão, no conjunto? Como pode a razão reencontrar a sua grandeza sem escorregar no irracional? Como pode a natureza aparecer novamente na sua verdadeira profundidade, nas suas exigências e com as suas indicações? Chamo à memória um processo da história política recente, esperando não ser mal entendido nem suscitar demasiadas polêmicas unilaterais.

Diria que o aparecimento do movimento ecológico na política alemã a partir dos Anos Setenta, apesar de não ter talvez aberto janelas, todavia foi, e continua a ser, um grito que anela por ar fresco, um grito que não se pode ignorar nem acantonar, porque se vislumbra nele muita irracionalidade. Pessoas jovens deram-se conta de que, nas nossas relações com a natureza, há algo que não está bem; que a matéria não é apenas uma material para nossa feitura, mas a própria terra traz em si a sua dignidade e devemos seguir as suas indicações. É claro que aqui não faço propaganda por um determinado partido político; nada me seria mais alheio do que isso.

Quando na nossa relação com a realidade há qualquer coisa que não funciona, então devemos todos refletir seriamente sobre o conjunto e todos somos reenviados à questão acerca dos fundamentos da nossa própria cultura. Seja-me permitido deter-me um momento mais neste ponto. A importância da ecologia é agora indiscutível. Devemos ouvir a linguagem da natureza e responder-lhe coerentemente. Mas quero ainda enfrentar decididamente um ponto que, hoje como ontem, é largamente descurado: existe também uma ecologia do homem. Também o homem possui uma natureza, que deve respeitar e não pode manipular como lhe apetece.

O homem não é apenas uma liberdade que se cria por si própria. O homem não se cria a si mesmo. Ele é espírito e vontade, mas é também natureza, e a sua vontade é justa quando ele escuta a natureza, respeita-a e quando se aceita a si mesmo por aquilo que é e que não se criou por si mesmo. Assim mesmo, e só assim, é que se realiza a verdadeira liberdade humana.

Voltemos aos conceitos fundamentais de natureza e razão, donde partíramos. O grande teórico do positivismo jurídico, Kelsen, em 1965 – com a idade de 84 anos –, abandonou o dualismo entre ser e dever ser. Dissera que as normas só podem derivar da vontade.

Consequentemente, a natureza só poderia conter em si mesma normas, se uma vontade tivesse colocado nela estas normas. Entretanto isto pressuporia um Deus criador, cuja vontade se inseriu na natureza. “Discutir sobre a verdade desta fé é absolutamente vão – observa ele a tal propósito (citado segundo Waldstein, op.cit., 19). Mas sê-lo-á verdadeiramente? – apetece-me perguntar. É verdadeiramente desprovido de sentido refletir se a razão objectiva que se manifesta na natureza não pressuponha uma Razão criadora, um Creator Spiritus?

Aqui deveria vir em nossa ajuda o patrimônio cultural da Europa. Foi na base da convicção sobre a existência de um Deus criador que se desenvolveram a ideia dos direitos humanos, a ideia da igualdade de todos os homens perante a lei, o conhecimento da inviolabilidade da dignidade humana em cada pessoa e a consciência da responsabilidade dos homens pelo seu agir. Estes conhecimentos da razão constituem a nossa memória cultural. Ignorá-la ou considerá-la como mero passado seria uma amputação da nossa cultura no seu todo e privá-la-ia da sua integralidade.

A cultura da Europa nasceu do encontro entre Jerusalém, Atenas e Roma, do encontro entre a fé no Deus de Israel, a razão filosófica dos Gregos e o pensamento jurídico de Roma. Este tríplice encontro forma a identidade íntima da Europa. Na consciência da responsabilidade do homem diante de Deus e no reconhecimento da dignidade inviolável do homem, de cada homem, este encontro fixou critérios do direito, cuja defesa é nossa tarefa neste momento histórico.

Ao jovem rei Salomão, na hora de assumir o poder, foi concedido formular um seu pedido. Que sucederia se nos fosse concedido a nós, legisladores de hoje, fazer um pedido? O que é que pediríamos? Penso que também hoje, em última análise, nada mais poderíamos desejar que um coração dócil, a capacidade de distinguir o bem do mal e, deste modo, estabelecer um direito verdadeiro, servir a justiça e a paz. Obrigado pela vossa atenção!


Fonte: cançãonova.com.br


Liberdade se desenvolve na responsabilidade, diz Papa
Nicole Melhado

Da Redação


Reuters

O Papa Bento XVI chegou às 10h30 (horário local) no Aeroporto de Berlim-Tegel
O Papa Bento XVI chegou na manhã desta quinta-feira, 22, ao Aeroporto de Berlim-Tegel, na Alemanha, dando início a sua 21º Viagem Apostólica Internacional.

Em sua primeira viagem de estado ao país, Bento XVI foi recebido pelo presidente Christian Wulff e pela chanceler Angela Merkel e agradeceu pelo convite desta visita, mas salientou que embora esta viagem seja uma visita oficial, que reforçará as boas relações entre a República Federal da Alemanha e a Santa Sé, ela não tem objetivos políticos ou econômicos, mas visa o encontro com o povo para lhes falar de Deus.


.: NA ÍNTEGRA - Discurso do Papa na chegada à Alemanha
“A respeito da religião, constatamos uma indiferença crescente na sociedade, que, nas suas decisões, tende a considerar a questão da verdade sobretudo como um obstáculo, dando por isso a prioridade às considerações utilitaristas”, destacou o Papa em seu discurso.
O Santo Padre salientou que é necessária uma base vinculativa para a convivência; caso contrário, cada um vive só para o seu individualismo.


Liberdade, responsabilidade e religião

“Ora um destes fundamentos para uma convivência bem sucedida é a religião. Assim como a religião precisa da liberdade, assim também a liberdade precisa da religião”, disse o Papa recordando as palavras do bispo alemão Wilhelm von Ketteler.

A liberdade, destacou o Papa, precisa de uma ligação primordial a uma instância superior. O fato de haver valores que não são de modo algum manipuláveis é a verdadeira garantia da nossa liberdade.

“O homem que se sente vinculado à verdade e ao bem estará imediatamente de acordo com isto: a liberdade só se desenvolve na responsabilidade face a um bem maior. Um tal bem só existe para todos juntos; por conseguinte, devo interessar-me sempre também dos meus vizinhos. A liberdade não pode ser vivida na ausência de relações”, enfatizou.

Na convivência humana, a liberdade não é possível sem a solidariedade, salientou Bento XVI explicando que um dano feito a outros, não é liberdade, mas uma ação culpável que prejudica aos outros e também a própria pessoa que comete o mal.

“Só usando também as minhas forças para o bem dos outros é que posso verdadeiramente realizar-me como pessoa livre. Isto vale não só no âmbito privado mas também na sociedade. Segundo o princípio de subsidiariedade, a sociedade deve dar espaço suficiente às estruturas inferiores para o seu desenvolvimento e, ao mesmo tempo, deve servir-lhes de suporte, de tal modo que, um dia, possam também manter-se por si sós”, reforçou o Papa.

Depois da recepção no Aeroporto, o Papa, juntamente com seu Secretário de Estado, Cardeal Tarcísio Bertone, teve um encontro privado com a chanceler Angela Merkel. Nesta quinta-feira, o Papa visita a Academia Católica onde almoça com os membros da comitiva papal. Após o almoço, o Santo Padre se dirigirá de carro para a sede da Nunciatura Apostólica em Berlim.


Fonte: cançãonova.com.br


Discurso do Papa ao parlamento é aguardado com expectativa
Nicole Melhado

Da Redação, com CTV (Tradução: equipe CN Notícias)


Arquivo / Vaticano

O embaixador da Alemanha junto à Santa Sé, Walter Jürgen Schmid salienta que dois terços dos alemães veem de maneira positiva a visita do Papa
Na tarde desta quinta-feira, 22, o Papa Bento XVI fará um pronunciamento diante do Parlamento alemão, momento bastante aguardo já que esta é uma honra concedida a poucos chefes de estado.

“Este não é um evento comum, é um evento extraordinário, para ambos os lados. Esta será a terceira vez que um Papa fala diante de um parlamento: antes de Bento XVI, João Paulo II falou diante do Parlamento polonês, o parlamento de sua pátria, e depois, como bispo de Roma, diante do Parlamento italiano. Bento XVI falará agora para o Parlamento alemão”, destaca o embaixador da Alemanha junto à Santa Sé, Walter Jürgen Schmid.

Esta visita do Papa ao parlamento foi um convite feito pelo próprio presidente do Bundestag (parlamento alemão), recorda o embaixador, salientando que todos os preparativos desta viagem foram desenvolvidos de modo muito delicado, atento e eficiente.

“Vale dizer que a Alemanha estava à espera do Papa de maneira muito cordial e aberta. Uma recente pesquisa mostrou que dois terços dos alemães veem de maneira positiva a vinda de Bento XVI: é o dobro dos católicos que vivem na Alemanha”, destaca o embaixador alemão.

Na tarde da sexta-feira, 23, o Papa vai à cidade de Etzelsbach para celebrar as Vésperas Marianas na Capela da Peregrinação. No sábado e no domingo, o Papa estará na cidade de Friburgo para o encontro com os jovens e com os católicos empenhados na Igreja e na sociedade, oportunidade para lembrar os desafios enfrentados pela sociedade hoje.

Embaixador Schmid ressalta que a Alemanha e a Santa Sé partilham de preocupações comuns referentes aos problemas sociais.

“Trata-se de problemáticas que dividimos a nível planetário: A questão de uma estrutura financeira razoável que reconheça o verdadeiro lugar de uma economia social; a questão de uma ordem econômica justa a qual o Papa referiu em sua encíclica. Depois existem as questões referentes aos cuidados ambientais, com a necessidade de transmitir às gerações futuras um mundo habitável, os direitos humanos... São muitos pontos de concordancia entre a política alemã e a Santa Sé”, destaca.


Fonte: cançãonova.com.br

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