A presidente Dilma Rousseff chegou nesta terça-feira a Nova
Déli para participar na quarta e na quinta da úpula dos Brics, já sabendo que
esse grupo das cinco grandes economias emergentes não lançará nem apoiará
candidato à presidência do Banco Mundial.
O anúncio foi feito por Sudhir Vyas, secretário de Assuntos
Econômicos do Ministério indiano de Relações Exteriores, e confirmado por
delegados brasileiros à cúpula dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África
do Sul).
O fato de não haver candidato comum ou apoio conjunto não
significa que cada país do grupo não possa apoiar um dos três nomes já
lançados. A África do Sul, por exemplo, fechou com a ministra nigeriana de
Economia, Ngozi Okonjo-Iweala, que, aliás, tem o apoio de todos os países
africanos.
Os outros dois candidatos são o ex-ministro colombiano José
Antonio Ocampo e o norte-americano de origem coreana, Jim Yong Kim, lançado
diretamente pelo presidente Barack Obama. Pela tradição do Banco desde a sua
criação em 1944, a presidência cabe a um indicado dos Estados Unidos, assim
como o diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional é escolhido pela
Europa.
Os Brics já haviam se omitido na escolha do sucessor do
francês Dominique Strauss-Khan no FMI, depois que este foi abatido por um
escândalo de natureza sexual.
Omitem-se de novo agora, depois que Robert Zoellick anunciou
seu afastamento, embora o objetivo inicial do grupo fosse exatamente o de
modificar o gerenciamento do sistema econômico-financeiro mundial, a cargo do
Banco Mundial e do FMI.
MÉRITO
A embaixadora Maria Edileuza Fontenele Reis, principal
negociadora brasileira nos BRICS, não acha que seja exatamente uma omissão.
"Não se trata de um problema de nomes, mas de mudar a maneira de escolher
os líderes dessas instituições. Deveria ser por mérito e não por critério
geográfico", diz.
Mas, em conversas informais, diplomatas brasileiros deram a
entender que acabará prevalecendo, também no Banco Mundial, o critério
tradicional - e geográfico, com a eleição de Yong Kim. "Se algum país quiser
que o presidente Barack Obama perca a eleição votará em outro candidato",
brincou um deles com a Folha.com.
É uma alusão ao óbvio fato de que, se os Estados Unidos
perderem, com Obama na presidência, um posto que ocupam há 67 anos, será um
vexame tão formidável que ele não será reeleito.
Pius Utomi Ekpei/Bruno Domingos/France Presse/Reuters
A ministra da Nigéria Ngozi Okonjo Iweala, indicada pelos
países africanos, e o acadêmico e ativista Jim Yong Kim, apoiado pelos
americanos.
Os Estados Unidos, além da tradição, contam com o fato de
que são os maiores acionistas do Banco Mundial, com 16,41% das cotas e, por
extensão, dos votos. Somados os principais países ricos que se alinham com os
norte-americanos nessa matéria, chega-se a 37,3% dos votos. São Japão,
Alemanha, Reino Unido e França.
OS Brics, atualmente, têm apenas 10% das cotas mas já há um
acordo no âmbito do G20, as maiores economias mundiais, para aumentar a
porcentagem para 16%. Ainda assim, os cinco ficariam com poder de fogo igual ao
de um só país, os Estados Unidos.
Esse predomínio norte-americano e europeu nas grandes
instituições financeiras multilaterais levou a Índia, anfitriã da quarta cúpula
dos BRICS, a propor a criação de um banco de desenvolvimento do próprio grupo,
uma espécie de BNDES dos Brics.
O encontro de quarta e quinta até encampará a proposta, mas
na forma de criação de um grupo de trabalho para estudá-la e não do lançamento
imediato do banco BRICS. O estudo "levará tempo", já avisa a
embaixadora Maria Edileuza.
CRISE EUROPEIA
A discussão econômica da cúpula acabará centrada de novo na
crise europeia. Os BRICS têm sido sondados para aumentar seu aporte ao Fundo
Monetário Internacional, que, por sua vez, daria respaldo financeiro aos países
europeus atolados em dívidas.
Mas, para que o aporte de fato ocorra, os Brics querem que,
antes, os europeus definam o tamanho do que vem sendo chamado de
"firewall"- um muro de proteção para evitar que o contágio da crise
grega e portuguesa atinja os grandes países da zona euro, também com problemas,
casos de Espanha e Itália.
A omissão dos Brics nos casos do FMI e do Banco Mundial
revela claramente como ainda é incipiente a capacidade de coordenação entre os
países-membros, que, além disso, têm divergências internas a resolver.
Prova-o outra das propostas para a cúpula, a de um acordo
para a concessão de empréstimos em yuan, a moeda chinesa, para os parceiros do
grupo.
Parece uma iniciativa simpática, mas "é importante
lembrar que os empréstimos chineses vêm atados a condicionamentos", diz
Samir Kapadia, pesquisador do Conselho Indiano de Relações Globais.
O Brasil já sentiu o peso dos condicionamentos: a Vale
recebeu, em 2010, empréstimo chinês de US$ 1,23 bilhão para a construção de 12
cargueiros.
Aceitou que fossem fabricados na China, para ira do então
presidente Lula, na esperança de que os chineses retribuíssem com a permissão
para que os navios transportassem grandes quantidades de minério de ferro para
a China.
A primeira tentativa fracassou, por pressão das concorrentes
chinesas, uma delas a poderosa estatal Cosco.
O tema ainda está em negociações entre os dois governos.
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A NOVA DÉLI
Fonte: Folha.uol.com
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