MARTA DIZ QUE LULA DEU SINAIS DE QUE PODERIA SER CANDIDATO EM 2014
Senadora Marta Suplicy
Para a senadora Marta Suplicy (SP), que foi
deputada, prefeita e duas vezes ministra pelo PT, o partido chegou a uma
encruzilhada: “Ou o PT muda, ou acaba”. Em entrevista ao Estado, Marta não
assumiu explicitamente, mas deixou evidente que está a um passo de sair do PT:
“Cada vez que abro um jornal, mais fico estarrecida com os desmandos. É esse o
partido que ajudei a criar?”.
Articuladora assumida do “Volta, Lula” em
2014, ela também deixou suficientemente claro que o ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva, em alguns momentos, autorizou os movimentos nesse sentido.
Quanto ao governo Dilma:
“Os desafios são gigantescos. Se ela não respeitar a
independência da equipe econômica, vai ser desastroso para o Brasil”.
A declaração mais irada foi contra o chefe da
Casa Civil, Aloizio Mercadante, que ela julga “inimigo do Lula” e
“candidatíssimo” a presidente em 2018, mas “vai ter contra si a arrogância e o
autoritarismo”. A seguir, os principais trechos da entrevista:
Por que a senhora articulou o movimento
“Volta, Lula”?
Em meados de 2013, os desmandos aconteciam e
a economia ia de mal a pior. Foi aí que disse ao Lula: ‘Presidente, está
acontecendo uma coisa muito séria. O que o senhor acha que está acontecendo?’
Conversamos a primeira, a segunda, a terceira, a quarta vez… E ele dizia: ‘É
verdade, estou conversando com ela, mas não adianta, ela não ouve’. A coisa foi
piorando e, um dia, ele disse: ‘Os empresários estão se desgarrando…’. E
perguntou se eu podia ajudar e organizei um jantar na minha casa, já no início
de 2014, com os 30 PIBs paulistas. Foi do Lázaro Brandão a quem você quiser
imaginar. Eles fizeram muitas críticas à política econômica e ao jeito da
presidente. E ele não se fez de rogado, entrou nas críticas, disse que era isso
mesmo. Naquele jeito do Lula, né? Quando o jantar acabou, todos estavam
satisfeitíssimos com ele.
E falaram nele como candidato?
Ninguém falou claramente, mas todo mundo saiu
dali com a convicção de que ele era, sim, o candidato.
Ele admitia que queria ser?
Nunca admitiu, mas decepava (sic) ela: ‘Não
ouve, não adianta falar.’
Ele estava incomodado com Dilma?
Extremamente incomodado. E isso é que foi
levando ele a achar que tinha de ser o candidato e fui percebendo que a ação
dele foi mudando. A verdade é que ele nunca disse, mas sempre quis ser
candidato e achou que ia ser.
Por isso a senhora trabalhou pela candidatura
do Lula?
Sim, providenciando os encontros para ele
poder se colocar. Foi quando convidei políticos, artistas para um grande
encontro político. Convidei a Dilma, o
Mercadante e todos os ministros de São
Paulo, avisando que o Lula estaria presente. Todos confirmaram, mas, na
véspera, todos cancelaram. E ela, Dilma, também não foi. Nessa época, ainda
estava confuso quem seria o candidato. Tinha uma disputa. E, depois, quando ela
virou candidatésima, ele não falava mais com ela.
O Lula deixava uma porta aberta?
Quando o Lula escolheu o Fernando Haddad para
disputar a Prefeitura, eu avisei a ele que eu ia sair do ministério, porque
discordava da política econômica, da condução do País, e ia voltar para o
Senado. ‘E vou dizer que o candidato é o senhor. A única que tem coragem de
dizer isso publicamente sou eu e vou dizer’. E ele: ‘Não vai, não, de jeito
nenhum’. Eu: ‘Por quê?’ Ele: ‘Porque não é hora’. Veja bem, ele não negou, ele
disse que não era hora.
Depois, como evoluiu?
Um dia, eu fui direta: ‘Lula, tem de ir pro
pau, tem de ter clareza nisso’. E listei pessoas com quem poderia conversar
para dizer que ele tinha interesse, que estava disposto. Aí ele disse que não,
que não era para falar com ninguém. O que eu ia fazer? Concordei. Só que,
quando eu já estava saindo, perto da porta, ele disse: ‘Pode falar com o Rui
(Falcão, presidente do PT)’. Dois dias depois, sentei duas horas e meia com o
Rui e disse a ele: ‘A situação está muito difícil eleitoralmente para o PT, mas
muito difícil para o País. Porque vai ser muito difícil a Dilma conduzir o País
de outro jeito, você já conhece o jeito dela’. Mas ele disse que íamos ganhar e
que eu estava falando de coisas que eu não entendia.
Acredita que o Lula queria ser (candidato em
2014)?
Ele é um grande estadista, mas não quis
enfrentar a Dilma. Pode ser da personalidade dele não ir para um enfrentamento
direto, ou porque achou que geraria uma tal disputa que os dois iriam perder.
E quando o próprio Lula encerrou de vez o
assunto?
Foi quando ele disse: ‘Marta, acabou. Vamos
trabalhar para a Dilma e pronto. Você vai enfiar a camisa e trabalhar de novo’.
E a senhora, nunca pensou em ser candidata?
A quê?
A presidente…
Pensei sim. Quando era neófita, tinha clareza
de que poderia ser presidente. Depois, isso caiu por terra, até que um dia o
Lula, no avião dele, quando era presidente, me disse: ‘Minha sucessora vai ser
uma mulher’. E pensei que ou seria eu, ou Marina (Silva) ou Dilma. Logo vi
aquela história de ‘mãe do PAC’ e que era a Dilma. Pensei: ‘O que faço?’ Bom,
ou ficava contra e não fazia coisa nenhuma, ou ajudava. Mais uma vez, decidi
ajudar. Sempre achei que ia acabar ficando meio de fora das coisas, talvez pela
origem, talvez por ser loura de olho azul, não sei.
Como vê o governo Dilma?
Os desafios agora são gigantescos, porque não
se engendraram as ações necessárias quando se percebeu o fracasso da política
econômica liderada por ela. Em 2013, esse fracasso era mais do que evidente.
Era preciso mudar a equipe econômica e o rumo da economia, e sabe por que ela
não mudou? Porque isso fortaleceria a candidatura do Lula, o ‘Volta, Lula’.
E a nova equipe econômica?
É experiente, qualificada. Vai depender de a
Dilma respeitar a independência da equipe. Se não respeitar, vai ser desastroso.
Agora, é preciso ter humildade e a forma de reconhecer os erros a esta altura é
deixar a equipe trabalhar. Mas ela não reconheceu na campanha, não reconheceu
no discurso de posse. Como que ela pode fazer agora?
Se Dilma não deixar a equipe econômica trabalhar,
os ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento) podem
correr para o Lula, pedindo apoio?
Você não está entendendo. O Lula está fora,
está totalmente fora.
Tudo isso criou uma cisão indelével no PT,
entre lulistas e dilmistas, como ficou claro na posse, quando o Lula foi frio
com o Mercadante?
O Mercadante é inimigo, o Rui traiu o partido
e o projeto do PT, e o partido se acovardou ao recusar um debate sobre quem era
melhor para o País, mesmo sabendo as limitações da Dilma. Já no primeiro dia,
vimos um ministério cujo critério foi a exclusão de todos que eram próximos do
Lula. O Gilberto Carvalho é o mais óbvio.
Qual o efeito disso em 2018?
Mercadante mente quando diz que Lula será o
candidato. Ele é candidatíssimo e está operando nessa direção desde a campanha,
quando houve um complô dele com Rui e João Santana (marqueteiro de Dilma) para
barrar Lula.
Quais as chances de vitória do PT com o
Mercadante?
Ele vai ter contra si sua arrogância, seu
autoritarismo, sua capacidade de promover trapalhadas. Mas ele já era o homem
forte do governo. Logo, todas as trapalhadas que ocorreram antes ocorrem agora
e ocorrerão depois terão a digital dele.
Afinal, quais são os desmandos da gestão do
Juca Ferreira na Cultura?
Foi uma gestão muito ruim. Enviei para a CGU
(Controladoria-Geral da União) tudo sobre desmandos e irregularidades da gestão
dele.
O que aconteceu com a Petrobrás?
Para mim, todo o conselho e diretoria
deveriam ter sido trocados. Respeito a Graça (Foster), até gosto dela. Não questiono
sua seriedade e honradez. Mas, no momento, o mais importante é salvar a
Petrobrás.
O PT foi criado com a aura de partido ético.
Imaginava que pudesse chegar a esse ponto?
Cada vez que abro um jornal, fico mais
estarrecida com os desmandos do que no dia anterior. É esse o partido que
ajudei a criar e fundar? Hoje, é um partido que sinto que não tenho mais nada a
ver com suas estruturas. É um partido cada vez mais isolado, que luta pela
manutenção no poder. E, se for analisar friamente, é um partido no qual estou
há muito tempo alijada e cerceada, impossibilitada de disputar e exercer cargos
para os quais estou habilitada.
Então, a senhora vai sair do PT.
A decisão não está tomada ainda, mas passei
um mês e meio, dois meses, chorando, com uma tristeza profunda, uma decepção
enorme, me sentindo uma idiota. Não tomei a decisão nem de sair, nem para qual
partido, mas tenho portas abertas e convites de praticamente todos, exceto do
PSDB e do DEM.
Para concorrer à Prefeitura?
Não será uma decisão em função de uma
possível disputa à Prefeitura, por isso é tão dura. É uma decisão duríssima de
quem acreditou tanto, de quem engoliu tanto.
Tem uma gota d’água?
Não, mas na campanha da Dilma e do
(Alexandre) Padilha em São Paulo, fui totalmente alijada. Quando Padilha me
ligou pedindo para eu gravar, disse: ‘Ô Padilha, entenda. Eu não sou mais
objeto utilitário, acabou essa minha função no PT’.
Por que Dilma e Padilha foram tão mal em São
Paulo?
Não foi um voto pró-Aécio (Neves), foi um
voto anti-PT, pelos desmandos que o
PT tem perpetrado nesses anos todos.
O que vai ocorrer com o PT?
Ou o PT muda ou acaba.
Por: Eliane Cantanhêde
Fonte: Estadão
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