Dr. Erik Jennings está preocupado com futuro da flona, fauna e riscos aos ribeirinhos
Preocupado com o futuro da fauna e da flora
no rio Tapajós e dos riscos provocados aos ribeirinhos com os projetos de
construção de barragens de hidrelétricas na região oeste do Pará, o médico Erik
Jennings, em entrevista exclusiva à nossa reportagem, alerta que a contaminação
por mercúrio poderá se agravar, após a conclusão dos empreendimentos.
“O Governo, através do Estudo de Impacto
Ambiental não está dando essas repostas. O EIA não contempla uma série de
questionamentos sobre esses impactos, como, por exemplo, o que vai acontecer
abaixo da barragem de São Luiz do Tapajós”, aponta Dr. Érik.
Segundo o médico, o mercúrio é uma das seis
substâncias mais tóxicas encontradas naturalmente no meio ambiente e, também
sendo um dos dezesseis mais raros elementos da natureza. “A sua forma metilada
(Metil-mercúrio) é altamente tóxica para as células do cérebro humano e outros
animais. Ele se torna tóxico, principalmente pela ingestão de peixes
contaminados e causa déficit de inteligência, falta de concentração e tremores
incontroláveis”, analisa Dr. Erik Jennings.
De acordo com ele, quando se represa um rio,
altamente contaminado por mercúrio, como já é o caso do Tapajós devido as
atividades de garimpos, cria-se uma condição ideal para a metilação do
mercúrio. “A pouca correnteza no reservatório e diferentes temperaturas que
será criada na foz dos tributários facilitará a metilação”, avisa Dr. Erik.
Ele explica que o metil-mercúrio se concentra
no fundo das represas e são jogados pelas turbinas que drenam exatamente o
fundo dos reservatórios e, que vários estudos têm demonstrado um aumento dos níveis
do mercúrio até 200 quilômetros depois da barragem, como é o caso da usina de
Balbina, no estado do Amazonas.
“Outros, demonstram níveis elevados em
habitantes de áreas de hidrelétrica, sofrendo principalmente as crianças e
mulheres em idade fértil. As crianças geradas por mães contaminadas terão
conseqüências devastadoras em seus cérebros. O EIA/RIMA do Tapajós não estudou
nenhuma comunidade a jusante de onde será a barragem. Ou seja, o principal
estudo que teria a obrigação de nos fazer entender o que acontecerá com nossa
saúde não ajuda em quase nada”, dispara Dr. Erik Jennings.
O médico neurocirurgião reforça que a
atividade garimpeira desenfreada com uso de mercúrio já é um grave problema no
rio Tapajós. “Somada ao represamento do rio poderá ser um verdadeiro barril de
pólvora, onde o alvo do tiro será o cérebro de nosso povo”, alerta Dr. Erik
jennings.
OURO E CONTAMINAÇÃO: Segundo especialistas em
meio ambiente, após a descoberta do ouro em 1958, a região do Tapajós sofreu
uma drástica transformação. Em pouco tempo dezenas de milhares de prospectores
de ouro, os garimpeiros, invadiram a cidade, os rios e, aos poucos, as matas.
Calcula-se que mais de 500 mil homens garimparam na região. As conseqüências
deste trabalho e da lavra desorganizada se fizeram sentir imediatamente.
Com o garimpo veio o dinheiro e,
naturalmente, os problemas inerentes a ele. Um dos pontos mais debatidos tanto
pela mídia nacional e internacional como pelos meios acadêmicos, foi o da
contaminação do meio ambiente, flora, fauna e pessoas pelo mercúrio.
O garimpeiro, para aumentar a recuperação das
finas partículas de ouro, usa o mercúrio na sua forma líquida. Este metal
líquido tem a propriedade de capturar os grãos de ouro formando um amálgama. Na
realidade, é este mesmo amálgama que foi usado até pouquíssimo tempo atrás, nas
obturações e próteses dentárias. Ou seja, a maioria dos cidadãos de meia idade
carrega uma fonte de mercúrio em sua boca.
No garimpo a operação com o mercúrio consiste
em colocar grandes quantidades deste metal líquido nas caixas (sluice boxes) em
posições estratégicas onde o ouro estará sendo também concentrado. O fluxo da
água faz o ouro entrar em contato com o mercúrio sendo imediatamente
aprisionado.
O processo é, em geral, muito rudimentar e
causa grandes perdas de mercúrio que é transportado pelas águas para os
rejeitos onde se infiltra. O amálgama que não foi perdido na garimpagem é, após
alguns dias, processado pelo garimpeiro com o intuito de recuperar o ouro e
parte do mercúrio metálico. Este processo é a maior fonte de contaminação dos
garimpeiros, pois nele é usado o maçarico, que vaporiza o mercúrio deixando
somente o ouro na sua forma sólida. Os vapores de mercúrio, pela inexistência
de equipamentos de proteção, máscaras e capelas, eram, parcialmente inalados
pelos garimpeiros e despejados na atmosfera.
LIVRO OS DESAFIOS DA MEDICINA NA AMAZÔNIA:
“Uma semana após ter visto uma foto feita por Paulo e ouvido seu relato sobre o
acontecido, uma criança ficou gravemente enferma em outra cidade próxima a
Santarém. O leito do hospital do qual sou diretor estava liberado e aguardava
pela criança. A aeronave e o médico já estavam preparados, porém, já se passava
das 18 horas e a mesma não poderia mais pousar na cidade onde o paciente
estava. Para completar a situação, o Município não tinha iluminação noturna, o
que era um entrave para o pouso. Diante dos fatos, o avião não mais poderia
pegar a criança naquele final de tarde, e ela possivelmente não mais resistiria
até a manhã do outro dia. Pensei em ligar para o destemido piloto e pedir a ele
que repetisse a façanha e pegasse aquele paciente de qualquer jeito, mesmo
durante a noite, com a iluminação improvisada. Porém, estaria arriscando demais
e se algo desse errado, ninguém iria compreender que estávamos fazendo algo
legítimo, humano, mas ilegal.
Não liguei para Paulo e fui para casa com o
coração angustiado, sentindo-me impotente diante das dificuldades. Antes de
colocar a cabeça no travesseiro, a enfermeira do hospital me liga.
– Doutor, a criança acabou de chegar em nosso
hospital! – me disse, toda contente.
– Como? Quem trouxe essa criança a essa hora
da noite? – perguntei.
– Foi um piloto e uma enfermeira, que não sei
o nome, em um monomotor, doutor.
A criança havia sido salva.”
São diversas histórias, como essa, que trazem
à tona a complexidade que é praticar medicina na região Amazônica, com enormes
obstáculos, mas com muita superação e, além de tudo, aprendizado. Todas as
crônicas, divididas em 21 capítulos, foram escritas pelo neurocirurgião do
Hospital Regional do Baixo Amazonas (HRBA), Érik Jennings.
Ele conta que a interação cultural é um
importante processo na medicina. E, com base nessas interações, ele quis reunir
o que de mais significativo viveu até aqui em sua trajetória como um
neurocirurgião da Amazônia. Até o nome da obra, Paradô, remete a isso, a um
encontro para conversas.
“Se você parar para pensar e conversar, você
aprende muito. Começa a ver que, para praticar uma medicina mais eficiente, tem
que entender a cultura, entender a geografia da região”, diz o médico, sempre
muito atento aos anseios das comunidades locais. Para ele, atuar no interior da
Amazônia é um grande desafio, pois atende-se a uma diversidade muito grande de
pessoas, com origens e culturas diferentes. “O médico vai atuar com populações
indígenas, remanescentes de quilombo, ribeirinhos, imigrantes de toda a
espécie, numa região do planeta onde você tem doenças relacionadas à floresta,
mas tem doenças relacionadas ao câncer e, no meio, tem as doenças relacionadas
ao trauma”.
O médico santareno tem uma relação muito
próxima com o HRBA. Ele lutou para que o hospital fosse construído e entrasse
em funcionamento, foi Diretor Técnico e, atualmente, é coordenador da equipe de
Neurocirurgia. Mas o fato que mais chama a atenção é a ligação que teve com o
homem que deu nome à instituição: Dr. Waldemar Penna.
Aos quatro anos de idade, Érik sofreu uma
grave queimadura. Uma panela que estava sobre o fogão caiu e despejou água
fervente sobre o seu corpo. Ele foi levado à Casa da Saúde, um hospital que
ficava na orla da cidade. O caso era grave. Os rins paralisaram. E o menino
entrou em coma. Coincidência ou não, quem o atendeu foi o médico Waldemar
Penna.
Santarém, na década de 1970, era bastante
deficiente no atendimento à saúde. E a família não tinha condição de
transportá-lo para um grande centro. A esperança se transformou em fé, mesmo
quando a situação apontava para o pior. “O Dr. Penna cuidou de mim, mas chegou
uma hora que não tinha mais o que fazer. Ele achava que eu ia morrer mesmo. Mas
por sorte do destino, o rim começou a funcionar e eu tive alta”, conta Érik
Jennings.
Décadas depois, e já formado em medicina, os
caminhos dos dois voltaram a se cruzar de forma impactante. Waldemar Penna
estava à beira da morte e chamou Jennings para cuidar dele. “Só que ele me
chamou e disse assim: ‘eu vou morrer, eu só quero que você tire a dor’”. Mesmo
com toda a argumentação, Penna disse que estava tranquilo, que nada poderia ser
feito. “Para com a sua ansiedade de querer fazer algo mais por mim, só faz o
que realmente tem para fazer, que é tirar a dor”. Eu acabei cuidando dele nos
últimos momentos, e isso foi muito marcante, porque foi um cara que cuidou de
mim quando moleque”, relembra Jennings.
Waldemar Penna estava com 91 anos quando
faleceu, em julho de 2005, por insuficiência respiratória. O médico lutava
contra um câncer de pulmão. Hoje, seu nome é carregado pelo Hospital Regional
do Baixo Amazonas, que é referência na região, no tratamento da doença.
“Recebemos esse exemplar da obra Paradô com
muito orgulho. Além de ser uma referência na Neurocirurgia do Norte do País,
Dr. Erik é reconhecido por toda a população como um médico extremamente
dedicado, humano e identificado com as suas raízes”, diz o Diretor Geral do
HRBA, Hebert Moreschi, e completa: “Ele é da região e conhece muito bem as
riquezas e os desafios da população e da medicina amazônica”.
O lançamento da obra ‘Paradô, histórias
vividas por um neurocirurgião da Amazônia, aconteceu durante o 8º Salão do
Livro do Baixo Amazonas, realizado de 6 a 15 de novembro, no Parque da Cidade,
em Santarém.
Por: Manoel Cardoso/Oimpacto
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