O Brasil teve, desde as últimas eleições municipais, em 2012, 142 prefeitos cassados e retirados do cargo pela Justiça Eleitoral – uma média de um a cada oito dias. É o que revela um levantamento feito pelo G1 com base nos dados dos Tribunais Regionais Eleitorais dos 26 estados e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
Além disso, outros 99 também foram cassados,
mas se mantêm no cargo com liminares e recursos, a poucos meses de um novo
pleito, que ocorre em outubro deste ano.
O levantamento não leva em conta os prefeitos
retirados do cargo pela Justiça comum ou pelas Câmaras municipais. Também não
inclui os cassados em primeira instância que já conseguiram reverter a decisão
em instância superior e não respondem mais a processo.
Motivos
A maioria dos prefeitos foi cassada em razão
de captação ilícita de votos e abuso de poder econômico durante a campanha. Há
também casos de conduta vedada pela legislação eleitoral. O dado de cassados no
cargo e fora dele representa 4% do total de prefeitos eleitos em 2012 (5.568).
O cientista político Malco Camargos, da PUC
Minas, diz que esse número tem aumentado eleição após eleição.
“Se por um lado as regras eleitorais têm
ficado mais rígidas e as promotorias eleitorais mais atuantes, de outro há uma
classe política que ainda não se acostumou a lidar com essa nova forma de
atuação das instituições. Isso cria uma necessidade de regulação com o passar
do tempo”, afirma.
“Um outro ponto importante é que hoje há uma
maior possibilidade de registro de provas com os meios eletrônicos, de
gravação. Fica mais fácil obter imagens que revelam práticas não permitidas nas
eleições”, diz Camargos.
No levantamento do G1 há casos de prefeitos
que passaram mais da metade do mandato cassados, porém mantidos no cargo por
recursos judiciais. São Paulo, maior colégio eleitoral do país, possui três
prefeitos nessa condição desde 2013.
Demora no
julgamento
Para Camargos, a demora no julgamento
pós-eleição é um dos principais problemas. "O sistema ainda não conseguiu
se modernizar para dar conta da celeridade que o processo eleitoral
exige", diz.
"Durante as eleições, até há uma
rapidez. Durante o mandato, no entanto, a esfera de recursos é muito lenta, o
que acaba gerando uma instabilidade.”
São Paulo e Minas Gerais lideram a lista de
prefeitos cassados definitivamente: 19 cada um. Outros 13 prefeitos paulistas
ainda governam tentando reverter a decisão; em Minas, 12 continuam no cargo à
base de liminares e interposição de recursos.
Apenas Acre e Roraima não têm cidades com
prefeitos cassados pela Justiça Eleitoral após a eleição de 2012.
Parte das cidades teve de realizar uma nova
eleição após a cassação. A lei eleitoral diz que a eleição suplementar deve
ocorrer caso o cassado tenha recebido mais de 50% dos votos válidos. Caso
contrário, o segundo colocado assume automaticamente.
Brigas em várias instâncias
O número de cassados nos TREs é bem superior
ao dado final registrado pelo G1, porque o TSE tem revertido vários casos pelo
país.
Em São Paulo, por exemplo, 19 políticos
conseguiram mudar a decisão de primeira instância que cassava os mandatos.
Em alguns municípios, isso fez com que
houvesse um troca-troca nas cadeiras, confundindo a população. Eleições
chegaram a ser realizadas, mas os novos prefeitos eleitos ficaram apenas meses
ou até dias no cargo, até que os cassados na primeira instância conseguissem
reverter a sentença no tribunal superior.
Dois municípios representam bem essa
situação. Em Goiás, a cidade de São Domingos teve dois prefeitos cassados em
pouco mais de um ano. Oldemar de Almeida Pinto Filho (PMDB) foi eleito, mas
acabou cassado por compra de votos e abuso de poder econômico. Uma nova eleição
foi marcada e vencida, em 2013, por Etélia Vanja Gonçalves (PDT).
Mas a Justiça Eleitoral detectou captação
ilícita de votos e recursos para a campanha durante a eleição suplementar, e
ela também foi retirada do cargo. O presidente da Câmara assumiu, mas uma nova
eleição ainda não foi realizada em razão de um recurso especial no TSE.
Marituba, no Pará, chegou a realizar, ao
custo de R$ 170 mil, uma nova eleição que, no fim, acabou não valendo. Eleito
em 2012, Mário Filho (PSD) teve a candidatura indeferida por ter a prestação de
contas do pleito anterior rejeitada. O mesmo ocorreu com o segundo colocado e o
terceiro não atingiu a quantidade suficiente de votos.
Assumiu a prefeitura, então, o presidente da
Câmara Wildson de Araújo Melo (PRB), cassado depois pela Justiça Eleitoral por
compra de votos.
Uma eleição suplementar, em 2013, foi vencida
por Elivan Faustino (PMDB), vice na chapa de Mário Filho. Ele, no entanto,
ocupou o cargo só por seis meses: em 2014, o TSE aceitou o recurso de Mário
Filho e, enfim, o empossou prefeito.
Problemas
Para Malco Camargos, a discussão que se faz é
“onde a política está agindo mais”. “Da mesma maneira que a ação contra
políticos tem promovido algumas pessoas e em busca disso alguns juízes têm
cometido excessos, de outro lado uma segunda instância que ainda depende da
indicação da parte política pode estar sendo mais comedida em seus atos",
afirma.
"Em outras palavras, tanto a primeira
como a segunda instância têm problemas: a primeira de vaidade, e a segunda de
dependência de questões políticas.”
Procurado, o TSE diz que tem como um dos seus
pilares de atuação o respeito à razoável duração do processo.
"No entanto, cabe ressaltar que cada
processo é único e demanda análise e julgamento em tempo e detalhamento
específicos. Por esses motivos, não é possível priorizar a celeridade em
detrimento da decisão mais correta possível e no devido processo legal para que
se garantam a ampla defesa e a interposição dos recursos legalmente
previstos", afirma o tribunal, em nota.
"O compromisso da atual gestão do
tribunal é de priorizar o julgamento de processos que possam resultar na perda
de mandato eletivo, de acordo com o Planejamento Estratégico TSE
2015-2020", completa o órgão.
Casos extras
Como o levantamento do G1 não inclui os
cassados pela Justiça comum, estão fora da lista vários outros políticos que
perderam o mandato pelo país. É o caso do prefeito de Mariana (MG) Celso Cota
(PSDB).
Eleito em 2012, ele deixou o comando do
Executivo meses antes da queda da barragem colocar o município sob o holofote
nacional. Cota foi considerado ficha suja em razão de uma condenação por
improbidade administrativa e acabou cassado pelo TJ-MG. Ao deixar o cargo, ele
divulgou nota considerado o afastamento “uma grande injustiça”.
Fonte: ORM News
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