De terça para quarta-feira o sono da presidente Dilma Rousseff deve ter sido tranquilo e restaurador, pois ela havia concebido e realizado um movimento tático nada menos do que genial na área política. À negativa dos principais dirigentes do PMDB de propor nomes para a reforma ministerial, a presidente ofereceu ao baixo clero do partido “aliado” na Câmara dos Deputados o excepcional privilégio de indicar dois nomes para compor o primeiro escalão do governo, um deles para a pasta de maior orçamento na Esplanada, a da Saúde. Depois de decidir, pela ampla margem de 42 votos a 9, que permaneceria – e quem não permaneceria? – na base de apoio a Dilma, a bancada peemedebista foi ao que interessava e no mesmo dia encaminhou ao Planalto os nomes dos colegas que gostaria de ver promovidos a ministros da Saúde e da pasta a ser criada com a fusão de Aviação Civil e dos Portos.
Esse episódio ilustra exemplarmente aquilo
que costuma acontecer na política quando amadores pretensiosos cometem a
insensatez de enfrentar profissionais. Dilma Rousseff, que imaginava passar por
cima dos principais líderes peemedebistas – Michel Temer, Renan Calheiros e
Eduardo Cunha –, acabou entregando ao PMDB exatamente aquilo que de qualquer
maneira seria obrigada a entregar para garantir alguma sobrevida no Congresso,
tendo permitido, porém, que os três líderes que se haviam recusado a indicar
novos ministros se preservassem de desgastes e, mantendo “altivez” e
“desprendimento” político, se credenciassem para o pós-Dilma.
No Brasil, circunstâncias e comportamentos
levam as pessoas a acreditar que a qualificação de um político como “profissional”
é sempre depreciativa. De fato, generaliza-se a tendência a considerar a
expressão “político profissional” um anátema. Mas o exercício da política,
definida como a arte de associar meios a fins na busca do bem comum – sem a
qual nenhuma sociedade livre e democrática consegue viver –, exige, sim, a ação
de agentes com perfil adequado e devidamente treinado para os desafios que essa
atividade apresenta. Mas que sejam profissionais competentes e honestos. Os
desvios de conduta dos maus políticos são uma praga a ser combatida,
democraticamente, com leis adequadas, fiscalização eficiente e, sobretudo, o
voto popular exercido com plena responsabilidade e consciência cívica.
Assim, não aproveita aos petistas o argumento
que lhes é tão caro de que é melhor ser um político amador que defende os
direitos do povo do que um profissional que só age em causa própria.
Acontecimentos recentes, como o mensalão e o petrolão, demonstram que ser
petista não é nenhuma garantia de probidade. Estão aí, ferreteados pela Justiça,
José Dirceu, Delúbio Soares, José Genoino, André Vargas, João Vaccari Neto,
Henrique Pizzolato e uma penca.
O PT, que surgiu para mudar “tudo isso que
está aí” e reescrever a História do Brasil, é um partido que só não pode ser
considerado igual a todos os outros porque, ao contrário da maior parte das
legendas, cultiva cuidadosamente a incompetência, quando se trata de fazer a
política correta e a administração eficiente e decente. Só é competente quando
se trata de aparelhar a máquina pública com seus apaniguados e de extrair do
Tesouro tudo o que for possível para alimentar seu projeto de poder – além, é
claro, da boa vida de não poucos. Pois tanta esperteza para o que não presta
não impediu que o partido da tigrada caísse no mundéu armado pelo PMDB.
Ter uma meia dúzia de Ministérios garantidos
ao PMDB nesta reforma ministerial meia-boca que Dilma está promovendo em
desespero de causa não é garantia nenhuma de que o Palácio do Planalto terá um
mínimo de tranquilidade e apoio para começar a tirar o País do enrosco
econômico, do impasse político, da tensão social e das profundezas da
imoralidade. Michel Temer, sempre cauteloso, mantém-se altivamente em seu
canto, à espera de um desenlace institucional do qual poderá ser o maior
beneficiário – se é que herdar o abacaxizal que Dilma plantou é realmente um
benefício. E o baixo clero do Congresso sabe a quem deve lealdade. Só Dilma não
percebe.
(Estadão)
Por: ercio
Nenhum comentário:
Postar um comentário